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AP 03 - XVI

Certo dia
li uma poesia
que falava sobre mim.

E, espantado,
não consegui perceber
que aquelas linhas
que escrevi
diziam, a você,
sobre mim.

Como também
não sei mais
se fui, sou ou estou sendo.
Logo
acreditar-se-á
que fui, apenas,
eu mesmo
no final.

AP 03 - XV

Perdi meu discernimento
no dia
em que escrevi
versos desalinhados
e
palavras
que rimam
apenas com
o
sentido.

Sentidos que perdi,
se foram.
Espero que ninguém
os encontrem
se eles estiverem, ainda,
por aí.

AP 03 - XIV

A fumaça vem e vai,
paira e, depois, rápida
se dissipa com o vento,
depois, não se enxerga mais.

Como o sol que queima
a minha pele
e a madrugada esfria
o meu rosto imóvel.

Verá, você, as variações
no fluxo do cotidiano,
e perceberá
que as mudanças
fazem parte da rotina
também.

AP 03 - XIII

Nestante
irei escrever uma poesia,
na qual
colocarei variações
de rimas e métricas.

Nesse instante
irei relaxar
e deixar fluir.

Colocar vários sentidos
em poucas frases.
Como se escrevesse
um parágrafo de prosa
para cada verso
e uma poesia
a cada palavra,
dita.

AP 03 - XII

Abri mão de
algumas modernidades;
respostas felizes;
um início legal
e da eternidade.

Inibido fico
e alguns de meus dedos,
(esticados)
me pedem
para encolhê-los
uma vez mais.

AP 03 - XI

Mudei esse novo verso
como os sons da cidade
se alternam entre
o dia e a noite.

As sílabas que,
em sua descontinuidade,
compreendem o silêncio,
o gozo, as escadas, o óbvio,
o próprio desandar.

E se atrasam.
E chegam cedo.
Talvez um meio termo
para mais ou menos,
pois, ele é um verso novo,
mudado.

AP 03 - X

Espero que a rádio
toque aquela música
da qual não sei o nome,
mas que sempre ouço
no mesmo horário.

Na freqüência,
aguardo o passar
(do tempo)
me acompanhar.

Sem sintonia, sem pudor,
sem destaque, sem vertigem,
sem opção nem razão,
ouso-me esperar,
apenas.

AP 03 - IX

Por trás de um verso
existe um universo,
totalmente inverso.

Certo, inversamente:
Errado, inverso, mente,
e a poesia só mente,
(ou não).
E o verso é do verbo ler,
ou do ver(só).


Tu parte em pedaços iguais,
mas, desigual, sempre parte,
para partir outra vez.

AP 03 - VIII

Ecos do sistema:
onde o ecossistema
dispersa e,
aos poucos,
não se ouve mais.

Ouve-se mais não,
onde,
aos poucos,
dispersa o ecossistema:
ecos do sistema.

Sistema do eco,
onde, dispersa,
aos poucos.

Aos poucos,
o sistema do eco.


AP 03 - VII

Não presto atenção,
porém,
olho para todos,
todos os lados.

Meus passos rápidos
não prestam atenção,
porém,
são rápidos mesmo assim.

Mesmo assim,
por todas as rápidas pegadas,
desatenciosas,
cruzo com a atenção
em um momento qualquer
de distração.

AP 03 - VI

Era só poeira.
E no meio do 'nada' o rio,
fecho os olhos.

Era só a estrada, o pó.
E no meio do 'nada' um lugar,
fecho os olhos.

Era só o cisco.
Nada no meio,
apenas os olhos.

AP 03 - V

Eu
perco o foco,
a fome,
o destino.
Vivo enfadado,
engarrafado.
Como percorrer
as mesmas ruas
da cidade
sem perceber
que elas são
sempre iguais,
desiguais.

AP 03 - IV

Estou em ostracismo,
como uma ostra
que, vivendo no mar,
prefere estar na praia.

Como versos,
de uma poesia ácida,
soando básico
aos nossos ouvidos.

Feito vento,
podendo voar lá fora,
vem até mim,
sentado no sofá da sala.

AP 03 - III

Choveu pouco agora a pouco
e do pouco, de agora,
está tudo molhado.
As músicas.
As palavras.
Os sentidos.

Agora, a pouco, choveu.
e então, o pouco, molhou.
Os tons.
As letras.
O corpo.

E daí se choveu?
E daí se molhou?
E daí se sinto frio?
E daí se a rádio
não toca a música
que gosto de ouvir?
E daí se me compram?
(eu gosto de me vender)